Voltar a morar na minha cidade não seria uma ideia tão ruim se eu tivesse como me mudar para o centro. Viver numa região periférica se mostra muito difícil, não só pelo preconceito escancarado nos comentários dos “amigos”, mas também pela distância da área comercial, pelo barulho constante, pelas pessoas sem educação que colocam o lixo na rua depois que a coleta passou, pelos urubus rasgando os sacos de lixo e disputando o conteúdo com os cães sarnentos, pela constante falta d’água, pela violência, o tráfico de drogas, os maus-tratos aos animais.
Tem também os colegas que se esforçam para manter uma conversa, mas não conseguem sair das platitudes; aqueles outros que se acham no direito de te pedir dinheiro emprestado – mesmo sabendo que não vão pagar –; os machistas, misóginos e tarados que só veem um pedaço de carne quando olham para as moçoilas que passam.
É um ambiente interessante se você quiser coletar material para escrever um livro, mas não é o mais adequado se você está depressivo, desempregado e tentando se reerguer.
Desde que cheguei a Ipiaú, tenho ouvido duas perguntas com certa frequência: 1) quando chegou?; e 2) quando volta?
Agora, uma terceira questão começa a aparecer: veio pra ficar?
Percebendo que estou aqui há quase um mês, algumas pessoas começam a se preocupar com uma possível concorrência profissional que eu possa representar.
É sempre curioso como a memória nos trai. Eu lembrava da casa da minha mãe bem maior do que ela é. Eu lembrava do calor da Bahia bem menos intenso do que ele se apresenta atualmente (principalmente se levarmos em consideração que ainda estamos no inverno).
A miséria do bairro, por sua vez, se apresenta para mim com uma força da qual não me recordava. Mas todos parecem se orgulhar do seu universo. Criticam constantemente a violência e falta de infraestrutura em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro. “Quem quer viver num inferno daqueles?”, indagam.
Ipiaú não tem uma livraria ou mesmo uma banca de jornal. Possui, no entanto, um monte de pequenos restaurantes com música ao vivo. O Rio das Contas já não é mais um local indicado para o lazer dos cidadãos, ao menos eu não teria coragem de passar uma tarde mergulhando naquelas águas.
Mas é provável que tudo isso seja preconceito de alguém que passou um período na cidade grande e voltou se achando cosmopolita.
Enquanto escrevo isso, o vizinho está ouvindo música de gosto duvidoso no volume máximo. Em minutos, o vizinho do outro lado resolverá entrar na competição para ver quem tem o aparelho de som mais potente e o pior gosto musical. Manter a calma e conseguir ouvir meus próprios pensamentos não é tarefa fácil. Mas foi daqui que eu saí. Esse lugar não me venceu antes e não me vencerá dessa vez.
José Fagner Alves Santos
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