Diferenças culturais nunca deveriam ser ignoradas. O ato de mudar-se para uma nova região e continuar agindo como se ainda estivesse no local anterior é um erro comum, mas grave. As variantes culturais impactam profundamente o convívio, principalmente no primeiro ano de estadia. Esta realidade se revelou intensamente para mim quando retornei à minha cidade natal, Ipiaú, no interior da Bahia, após anos vivendo e lecionando em São Paulo.
A experiência de lecionar como professor substituto no curso de letras de uma universidade local trouxe à tona uma série de comparações inevitáveis, embora indesejadas, entre meus novos alunos e aqueles que tive no ensino médio em São Paulo. Essa comparação, no entanto, revelou-se injusta e covarde, uma vez que as realidades, necessidades e demandas entre esses dois universos são radicalmente distintas.
Logo no início, senti uma profunda frustração. A leitura prévia do conteúdo a ser discutido em sala de aula era uma raridade entre os alunos; fofocas eram uma constante e a falta de consciência sobre o privilégio de estar em um ambiente universitário parecia ser a norma. Sentia-me como Simão Bacamarte, do conto "O Alienista" de Machado de Assis: se o diferente sou eu, então eu sou o anormal.
A Complexidade das Diferenças Culturais
Em São Paulo, por exemplo, a cultura escolar é marcada por uma competitividade intensa e uma pressão constante por resultados acadêmicos. A realidade de Ipiaú, por outro lado, é moldada por um ritmo de vida mais tranquilo e por uma proximidade comunitária que influencia diretamente a dinâmica escolar. Essa disparidade cria desafios significativos para um educador acostumado com um ambiente urbano e altamente competitivo.
A Frustração do Educador
No entanto, essa adaptação é um processo difícil e, muitas vezes, doloroso. Como educador, precisei reavaliar minhas abordagens pedagógicas e encontrar maneiras de engajar os alunos que fossem relevantes para o seu contexto. A leitura prévia dos textos, por exemplo, não poderia ser simplesmente exigida; precisava ser incentivada de uma forma que despertasse o interesse genuíno dos estudantes.
A Adaptação Necessária
Ao aplicar essa perspectiva, comecei a diversificar as atividades em sala de aula, incorporando elementos que iam além da leitura e escrita tradicionais. Utilizei recursos visuais, atividades práticas e discussões em grupo para tornar o aprendizado mais dinâmico e acessível. Essa abordagem não apenas aumentou o engajamento dos alunos, mas também revelou talentos e habilidades que haviam passado despercebidos em um modelo de ensino mais convencional.
A Reflexão Pessoal
Entender a cultura de meus alunos não significou apenas adaptar minhas práticas pedagógicas, mas também reconhecer e valorizar suas experiências e perspectivas. Esse reconhecimento é um passo fundamental para construir uma educação mais inclusiva e relevante, que respeite e celebre a diversidade cultural.
As diferenças culturais, longe de serem obstáculos, podem ser fontes ricas de aprendizado e crescimento. A experiência de retornar à minha cidade natal e lecionar em um contexto cultural diferente me ensinou a importância da flexibilidade e da empatia no processo educativo. Como educador, é crucial estar aberto às transformações e disposto a aprender tanto quanto a ensinar.
A frustração inicial deu lugar a uma apreciação mais profunda das complexidades culturais e das maneiras únicas pelas quais cada grupo de alunos interage com o conhecimento. Em última análise, a adaptação e o respeito pelas diferenças culturais não apenas enriquecem a prática pedagógica, mas também contribuem para a formação de uma sociedade mais justa e compreensiva.
Esta jornada de adaptação e aprendizado contínuo é um testemunho da resiliência e da capacidade humana de crescer através das diferenças, lembrando-nos sempre das palavras de Paulo Freire: "Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão".
José Fagner Alves Santos
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