Se me pedissem para definir poesia, eu hesitaria. Não por falta de amor a ela — amo-a talvez mais do que qualquer outra forma escrita —, mas porque, como a beleza ou o medo, ela é uma coisa que escapa. E, no entanto, por mais que escape, a reconhecemos. “Sei o que é quando vejo”, disse o juiz Potter Stewart sobre a pornografia, e não creio que ele imaginasse que essa frase, meio resignada, meio pragmática, seria um dia usada para tentar capturar o espírito da poesia.
Mas talvez ele estivesse certo em espírito. Talvez a poesia, como a pornografia, seja uma questão de impacto sensorial, de reconhecimento súbito. Só que, ao contrário da pornografia — que vive da evidência —, a poesia é feita do que falta. Do que não é dito. Do que foi elidido com precisão cirúrgica, como nota Ben Lerner ao examinar os erros gritantes de William McGonagall. Elidiu-se uma sílaba — e ali, onde deveria surgir a música, aparece a pancada seca do ridículo.
Não é difícil rir de um mau poema. O difícil é entender o que faz um poema bom. E mais difícil ainda, admitir que nem todo poema bom precisa soar bem. Walt Whitman berrava seus versos como um pregador ensandecido. Emily Dickinson escrevia como se tivesse medo de ser ouvida. Claudia Rankine documenta a dor com a frieza de uma câmera de segurança. Todos eles são poetas. Nenhum deles cabe na definição do outro.
Sempre achei que escrever era, no fundo, um ato de escuta. E escutar poesia é escutar aquilo que não se pode medir por régua ou métrica — mas que, ainda assim, tem forma. Lerner fala de um adolescente num hipermercado de Topeka, Kansas. Eu penso em mim mesmo, garoto em Nova Orleans, ouvindo minha mãe dizer frases que, hoje, entendo como versos: “Não coma depressa, Truman, o tempo mastiga mais lento que você.”
O século XXI parece ter deixado para trás a vontade de encontrar verdades universais. Em vez disso, acumulamos exceções. Abrimos o leque da sensibilidade até ele se tornar uma rosa dos ventos em convulsão. É bonito, em parte. É também confuso. E, nesse panorama, é reconfortante que existam críticos como Lerner. Ele não aponta com o dedo; ele acende uma lanterna. Mostra que a regra pode falhar — mas a exceção, essa sim, pode ser inesquecível.
Talvez nunca cheguemos a uma definição de poesia. Talvez, como Stewart, tenhamos de continuar dizendo “sei o que é quando vejo”. Mas mesmo essa frase, no fundo, carrega em si o gesto poético: o reconhecimento de um mistério que se afirma mais pela presença do que pela explicação.
E disso, disso sim, eu tenho certeza — como de uma brisa que bate na nuca, vinda de lugar nenhum.
You'll Love These
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